quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Seu Chico. Dona Maria


História real, embalada com um pequeno ‘dacim’ de fantasia.

As velhas paredes não eram apenas quatro, talvez fossem dez ou onze. De janelas a casa estava cheia, e as duas alas separavam não raças, nem cores, muito menos ideologias, separavam apenas homens de mulheres. Dona Maria, vestido florido, amigas ao redor, sempre sonhara em outro tipo de vestido, o velho rendado, laçado com fita de cetim, trançado com pequenos bordados feitos a mão. O maior sonho foi morrendo no mesmo tempo em que as rugas apareciam com mais frequência. Seu Chico, barba feita, camisa xadrez sempre por dentro da calça social, bem passada, feito homem de boa índole, de bom caráter, de criação familiar decente. Seu Chico, Dona Maria, divididos por uma cortina que lembrava uma velha saia que Maria mesmo costurou na infância. Da janela do quarto, certo dia então Chico resolveu ver a vida passar. A vida passou anos do mesmo ângulo. As roupas não estavam mais passadas nem a gola engomada. Já Maria, depois de viver para os outros, acabou sozinha, passeando pelo quintal, vendo as flores nascerem na primavera e morrerem no outono, diante das primeiras geadas que antecedem o inverno. Da mesma janela, feito criança, ele se apaixonou pela donzela que trafegava de vestido florido, comprido até o pé, passeando no meio do jardim, olhando com sorriso de canto de boca as flores que nasciam ainda timidamente. Ela, de olhar quase sorrindo viu o amor dos sonhos chegar naquele bom dia animado, que demorara mais de um ano para acontecer.
Um ano demorou para que o vestido fitado virasse realidade. E virou em uma festa que alegrou o coração dos vizinhos, que presenciaram juntos, ao pé do altar, o primeiro beijo dos pombinhos loucamente apaixonados, um pelo sorriso, a outra pelo olhar. A festa durou a tarde toda, e no fim da noite, na noite de núpcias, o sonho do primeiro casamento era a calmaria que trouxe a lua cair mais bonita. O sonho era de ambos, o primeiro casamento também.

A verdadeira história é de um casal idoso que se encontrou em um asilo local. Ela e ele, oriundos do sonho do casamento eterno, nunca (até então) chegaram ao altar e abandonados por todos os outros, acabaram na casa separada por alas. Ele não tinha uma perna, vitima de acidente, e esperava na janela porque não podia passear no jardim, a vergonha não deixava. Apaixonados, realizaram o sonho juntos, e ao altar subiram há algum tempo. Sabe-se lá porque, mas essa é uma história que me lembrou uma antiga canção, e que de uma hora para a outra, me fez refletir sobre o amor, e sobre o poder dele na nossa vida. Quem dera eu encontre um Chico pra mim, e que ele seja tão eterno quanto as lembranças dele no meu coração.

“Eu encontrei, quando não quis, mais procurar, o meu amor.... E até quem me vê, lendo o jornal, ou , na fila do pão, sabe que eu te encontrei e ninguém dirá QUE É TARDE DEMAIS”. (Último Romance- Los Hermanos)

Nenhum comentário:

Postar um comentário